Clint Eastwood tem uma das carreiras mais curiosas de Hollywood. O ator limitado que ganhou notoriedade nos excelentes faroestes de Sergio Leone eventualmente começou a dirigir filmes e se tornou um dos maiores diretores americanos da história apesar da inconsistência na carreira, que varia entre obras-primas como Os Imperdoáveis (1992) e Cartas de Iwo Jima (2006) e filmes medianos ou fracos como Sully: O Herói do Rio Hudson (2016) e Sniper Americano (2014).

Na última década, mesmo sendo um dos diretores mais prolíficos da atualidade, infelizmente Eastwood entregou com raríssimas exceções apenas trabalhos medianos. Esse fato, no entanto, não deveria afastar o público das salas de cinema, pois mesmo não sendo um destaque no meio de sua filmografia Clint entrega com O Caso Richard Jewell (2020) um filme competente e uma volta a qualidade não vista pelo menos desde Gran Torino (2008).


Quem assina o roteiro é Billy Ray, que já entregou excelentes trabalhos dentro do gênero da cinebiografia como Capitão Phillips (2013) e O Preço de uma Verdade (2003) e aqui ele mostra sua experiência com o gênero nos dois extremos. Se a familiaridade com o estilo o permite ser corajoso em alguns aspectos ao retratar personagens que, é importante lembrar, são pessoas reais, por outro lado entrega um roteiro formulaico que segue todas as notas conhecidas do gênero. Por tratar de pessoas reais envolvidas na história o filme não conseguiu fugir de polêmicas, em boa parte com exagero do público, mas no caso da jornalista Kathy Scruggs interpretada por Olivia Wilde esta deveria ter sido tratada com mais delicadeza por parte do roteiro e da direção, apesar de ser entendível a escolha pois a personagem estava lá para representar a mídia de uma maneira geral e tendo o justo papel de vilã da história.

A história segue na maior parte do tempo Richard Jewell, o segurança que salvou incontáveis vidas no atentado que ocorreu em Atlanta durante os jogos olímpicos de 1996, e o inferno em que a mídia transformou a vida dele e de sua mãe. O filme prefere focar em contar em detalhes o ocorrido e os meses consequentes ao ato e não a psique dos personagens secundários e clima politico da época, e assim sendo quanto menos informações você estiver sobre a história previamente melhor. Se o caso já é amplamente conhecido pelo espectador, provavelmente o filme não será tão apreciado.


Toda a parte técnica é competente, a edição é bem ágil durante quase toda a duração do filme, apesar de perder um pouco de fôlego no final do segundo ato e insistir em repetir algumas cenas onde não era necessário ou passar a mesma mensagem em cenas desnecessárias (como diversas vezes personagens olhando pelas frestas da cortina, ou duas pessoas diferentes fazerem o mesmo percurso para descobrirem informações que o público já sabe, e conversar sobre o mesmo entre eles). A trilha sonora geralmente fica em segundo plano e não há momentos de destaque, o que de nenhuma maneira é um defeito, e sim um sinal de uma trilha operante. Já a parte diegética da mesma, principalmente em conjunto com a mixagem de som, é perfeita com toda a sequência dos shows que culmina no atentado chamando atenção em como é bem trabalhada.

Nas atuações é onde provavelmente se encontra a maior surpresa do filme pois Clint Eastwood, pelo menos em comparação aos diretores de seu patamar, não tem seus atores entregando um trabalho em tão alto nível (obviamente há atuações em seus filmes que ficaram para a história do cinema como Sean Penn em Sobre Meninos e Lobos (2003) ou Hilary Swank em Menina de Ouro (2004)). Todo o elenco principal está extraordinário aqui, Olivia Wilde e Jon Hamm entregam muito, mesmo tendo personagens mais limitados, Sam Rockwell está perfeito em um papel bem diferente do que geralmente faz em sua carreira como o íntegro advogado Watson Bryant. Mesmo com todos os elogios até então, o show mesmo é dado pela personagem que dá nome ao filme e sua mãe, Kathy Bates, que entrega outra de suas grandes atuações em uma personagem que é mais que apenas "mãe do herói", conseguindo imprimir emoções fortes em cenas simples como aumentar o volume da televisão ou reclamar sobre seus tupperwares. Já Paul Walter Hauser no papel principal é uma revelação, alguém que merecia ser mais reconhecido na temporada de premiações até então, com uma atuação cheia de nuances e que vende com perfeição a obsessão de sua personagem em ser o melhor possível em qualquer trabalho que esteja fazendo além de seu sonho em ser um agente da lei, um balanço perfeito entre o cômico e o dramático, o coração do filme.


Ao acender das luzes, o espectador recebe um filme que, se não perfeito, é muito competente e entretém com uma história interessante que vai agradar quem gosta de biografia, quem gosta do herói improvável e quem ansiava por uma volta a forma de Clint Eastwood. Apesar de não conseguir esconder (e nem tentar) por completo sua política, aqui é bem mais sutil que em seus outros filmes e não incomodará quem já se incomodou com isto em seus filmes anteriores, com o diretor inclusive se preocupando mais no aspecto da "autocrítica" da mesma. Um filme bem atuado, bem dirigido, bem escrito e que vale seu ingresso no cinema.




Nota 7,5/10

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